Confira uma entrevista com a artista visual Adélia Clavien
Adélia faz da curiosidade seu caminho para novas descobertas, às quais dedica todo seu talento e sua energia. Sua paixão pela arte se manifesta com intensidade: Música, Dança, Fotografia e Pintura são instrumentos para que ela expresse sua visão segura e muito própria da vida. Tocando sax, acordeão (sanfona) ou compondo suas imagens, é sua personalidade que se faz presente e nos dá um exemplo real de como é a vida quando vivemos aquilo que nos faz felizes.
Nesta entrevista, Adélia nos fala sobre a Suíça, seus primeiros passos e sua visão da Arte e da sociedade.
Como a Arte entrou em sua vida?
Sempre gostei de Arte e sempre fui muito curiosa. Isso me levou a descobrir o prazer e o encanto na dança, na música, na aprendizagem de idiomas estrangeiros e na fotografia com a qual eu desenvolvi muitas capacidades de apreciação do mundo e das belezas que nos rodeiam. Com os vários idiomas aprendidos eu criei a possibilidade de me comunicar com as pessoas. Acho fantástico poder conversar onde quer que eu vá e compreender o que se está falando ao meu redor. Eu sou assim: quero saber, quero fazer, quando tenho curiosidade eu vou em frente. Música, Fotografia, Pintura, se transformaram em grandes paixões (entre muitas e muitas mais…).
O que a levou a morar na Suíça?
É uma história interessante, engraçada até. Com 18 anos, vivi aquela coisa de adolescente, queria sair de casa, viajar. Fui visitar minha irmã que vivia na Suíça e me apaixonei pelo país. A Suíça é linda, você se sente num cartão postal. No início vim com uma amiga. O plano era dar a volta ao mundo. E a volta ao mundo parou na Suíça (risos), nunca mais saímos daqui. Sempre volto a Portugal para visitar a família, mas já faz mais 40 anos que a Suíça conquistou meu coração. Os suíços dizem que eu sou mais suíça que eles mesmos pois o fato de eu ser muito organizada faz parte do meu sucesso . Eu sou muito “quadrada” – quando eu faço qualquer coisa tem de ser bem feito. Por isso mesmo eu falo que eu tenho uma maneira de funcionar muito suíça e que me tem favorecido bastante no mundo do trabalho e agora no mundo da pintura. Em Portugal também me dizem que eu fiquei muito suíça e não poderia mais viver lá. Se eu voltasse para Portugal eu ia querer revolucionar algumas coisas. Mas como não sou revolucionária por natureza, aí eu continuo vivendo na Suiça. E é claro que continuo amando o meu querido país onde eu vou regularmente – hoje a viagem entre Portugal e a Suíça demora uma hora, uma hora e meia. As distâncias não são nada hoje em dia. A gente tem de viver onde está bem, onde está feliz e eu estou feliz vivendo na Suíça. Eu me identifico com a distinção, com a cultura, com a educação, com o civismo com tantas coisas que gostaria de ver mais valorizadas em Portugal, embora as coisas tenham evoluído por lá. São países e culturas diferentes. Acho que fico o resto da vida aqui. Veremos. O futuro dirá.
Você já esteve no Brasil?
Nunca estive no Brasil mas acho que cada Português tem o Brasil no coração. Não sei se é assim para os brasileiros também. Acho que sim, porque há qualquer coisa entre nós, faz parte das nossas histórias, da sua, da minha, independente do passado, da colonização. Sempre amei o Brasil. Sei que um dia vou visitar o Brasil. É um sonho, já poderia ter ido muitas vezes. Mas eu tenho medo de andar de avião, é tão longe, tantas horas de voo… Eu já fui a Cuba e aos Estados Unidos e foi bastante complicado. Custou-me muitos soníferos. Mas foi tão lindo! Mas bem no fundo eu sei que um dia eu vou ao Brasil!
Sua biografia apresenta uma pessoa multifacetada: música, pintura, informática e fotografia. Como você desenvolveu esses dons?
Eu só desenvolvi o que comigo já nasceu ! Minha mãe era uma pessoa de negócios que apreciava muito a música, a Natureza e todas as coisas belas da vida. Desde pequena envolvida pelas canções, comecei a tocar acordeão (sanfona) com 8 anos. Começou espontaneamente, essas coisas não têm explicação. Acho que os dons fazem parte da personalidade de cada um de nós e às vezes certas pessoas se dedicam a desenvolvê-los e outras não. Quando eu sinto que há algo que me interessa eu vou em frente e tento. Se não der certo, não deu certo. Se eu sinto que tenho um dom, eu vou pesquisar, vou fazer o possível para aprender e me dedicar 100%.
Em sua Arte você retrata muito o Feminino, há mulheres famosas de décadas passadas. Fale sobre isso.
Em minhas imagens eu trago mulheres famosas, não-famosas, anônimas, predomina o feminino mas há espaço para o masculino também. Há rostos marcantes que me “falam”, olhares, jeitos, atitudes que me atraem. Não tem nada a ver com política, tem a ver com beleza ou com a expressão de certas pessoas – são rostos que simplesmente me atraem. Claro que há certas personalidades que eu retratei e que tenho sempre ideias para elas. É o caso da Marilyn Monroe. Eu sempre adorei a Marilyn por sua beleza extrema. Há uma doçura, uma tristeza nela. Não sei por que, muitas vezes vou fazer um retrato e quando percebo já estou de novo na Marilyn. Marilyn, Charles Chaplin, Hugh Grant (esse ainda não publiquei), Leonard Cohen, que ainda não publiquei também etc. São rostos que dizem algo, são expressivos, que eu aprecio e tem aquela coisinha difícil de explicar: eu gosto. Pinto mais mulheres, não sei, talvez por sermos mais bonitas (risos). O que prevalece é o momento. Eu tenho um enorme banco de imagens: fotografias, estruturas, flores, objetos, jovens, mulheres, animais e quando vou decidir o que vou fazer hoje, de repente já optei pela mulher novamente. A explicação pode estar no olhar das mulheres. Um olhar que diz muito. Talvez seja por isso.
Como desenvolveu seu estilo?
Meu estilo? Qual? Pop Art? Abstrato? Naive? Ultimamente estou mais concentrada no Pop Art, meio parada no abstrato. Gosto muito de fazer abstrato, mas tem faltado tempo. E o público está gostando muito do Pop Art. Isso começou assim, numa brincadeira. Eu sempre fiz muitas composições de fotos, eu sempre gostei disso. Vinte anos atrás (eu sempre guardo minhas fotos, gosto muito de revê-las) eu já fazia minhas composições. Antes mais simples, elas com o tempo se tornaram cada vez mais interessantes, mais profundas, e trazem toda uma mensagem. É um estilo muito bonito e que está agradando muito. Quanto mais eu vejo que agrada, mais eu invisto, tento fazer cada vez melhor, mais forte de modo a realmente causar impacto.
E a primeira dessa série de Pop Art começou numa brincadeira. Eu sempre fotografei, então fiz muitas fotos da filha do meu companheiro, Tierry. Num Natal eu não sabia o que dar de presente, os adolescentes hoje têm tudo, então eu pensei: Por que nao fazer um quadro assim, especial, com uma das bonitas fotos da Marina? E eu fiz um quadro 100×100, um quadro grande uma composição bonita, de 7 ou 8 fotos, ficou muito bonito ela adorou. Foi assim que começou esta bela aventura que tem me levado a fazer minhas obras viajarem para vários países do mundo.
Nós sabemos que a arte reflete o contexto social de sua época. Como ela se caracteriza nos tempos atuais e o que estaria refletindo sobre o mundo em que vivemos?
A Arte, é claro, reflete o mundo que vivemos. E o que vivemos hoje é a mescla de muitas coisas, de muita informação e talvez isso também possa ser dito dos meus Pop Arts. Pequenos fragmentos de informação, às vezes meio escondidos, muitos detalhes, muitas mensagens sobre a nossa sociedade que eu queira passar, às vezes até mesmo de forma inconsciente. Quando estou fazendo minhas composições, é tudo muito rápido, mas às vezes até parece que há qualquer coisa que me atrai e me faz chegar até uma foto e eu sinto: É isso que eu vou por! Não é estudado, é muito espontâneo o que eu faço e depois quando está terminado eu me pergunto: mas por quê eu fui escolher esta imagem? Não sei. Não tem nada a ver com política, com fatos, com personalidades, tem a ver com o que eu sinto no momento. Com a minha espontaneidade, o que me fala, o que me atrai e é isso que eu tento passar para os meus projetos. No fim eu digo: é isso mesmo que eu queria com essa imagem! Nesse momento eu sinto que consegui criar e fico contente comigo mesma.
Em sua avaliação, qual o papel do artista na sociedade?
Eu questiono o próprio termo “artista”. Sou uma apaixonada pela Arte e pela descoberta, sou curiosa. Eu acho que o artista tem um papel importante na sociedade mas ele nem sempre é bem interpretado. Muitas vezes sua influência só acontece mais tarde. Às vezes o reconhecimento não chega em vida. Só quando ele não está mais entre nós é que ele é descoberto, admirado e compreendido pelo público. Muitas vezes o artista vive como um anônimo. Ninguém compreende realmente sua mensagem. Mas é muito importante o seu papel. Ao proporcionar o prazer estético, a Identificação e todo um conjunto de mensagens ao mesmo tempo poéticas e sociais.
Quais pintores você mais admira?
Pintores que admiro? São tantos, tantos, tantos… Eu sou uma grande admiradora de tudo que é Surrealismo. Gosto muito do Clássico, do Contemporâneo, gosto muito da loucura de um Degas, do dom de um Goya, de um Toulouse-Lautrec, do Dante Gabriel, do Dalí, Michel Salvati, Hans Dahl, Pierre de Courtois, Antoine Watteau. Gosto muito de Michelangelo, do chinês Zao Wou-ki. Hoje as plataformas digitais nos permitem conhecer um número enorme de artistas maravilhosos. Esperamos que eles possam ser um dia reconhecidos e que também deixem suas marcas na história porque infelizmente quando se fala de artistas, para os grandes museus (essas grandes empresas), são sempre os mesmos, já sabemos: é Dalí, é van Gogh, é Goya. Temos tantos milhões de artistas. Agradeço muito a você Marisa e a todos que trabalham para dar destaque aos artistas de hoje que, talvez, também marcarão sua presença na história artística do futuro. Espero que sim. Há lugar para todos, o livro é grande.
Qual obra sua você destacaria como um marco na sua vida artística?
Eu destacaria uma imagem da Marilyn Monroe, que marcou muito, e continua a marcar. Foi uma das primeiras, em vermelho. “Eu amo América”, foi a que me fez ser convidada para expor na América. Foi exposta e comprada lá. Ela tem sido vendida em diferentes edições. É uma obra que me toca. Que me marca e continuará a marcar porque é uma obra forte. Ela apresenta uma rachadura no meio, que remete à vida da Marilyn: o lado belo e o sombrio. Nós também temos em nossas vidas um lado belo e um lado de tristezas e dramas. É a obra que eu destacaria.
Qual sua mensagem para quem está começando na Arte?
Eu acho que todas as pessoas que têm a arte no coração, seja pintura, seja dança, seja música, todas as artes ou paixões, têm de ir em frente. Temos um compromisso pessoal de tentar exprimir, tentar mostrar aos outros o que sentimos, sem nos deixarmos abater por comentários que por vezes tentam nos derrubar. Você não pode se deixar impressionar por eles. Se você tem uma ideia, uma paixão, há que ir até o fim com ela, realizá-la. É muito importante realizar os nossos sonhos, nossas paixões. E justamente quando estamos no começo da jornada precisamos ser fortes porque muitos podem não apreciar, não admirar ou não compreender o que queremos exprimir. Então pode haver críticas negativas e isso pode ter um efeito destrutivo. O artista deve ser forte e acreditar em sua própria arte. Aí ele consegue avançar. A nossa paixão primeiro. E depois, todo o resto.
Combatemos, buscamos e estamos cientes de nossa própria arte, então quer os outros gostem ou não, vamos em frente. Um dia isso só nos trará felicidade porque chega um momento em que as pessoas gostam, apreciam e conseguem finalmente compreender o que transmitimos. É um prêmio, uma satisfação muito grande. Enfim, o importante é nunca se render e acreditar muito em você mesma.
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